Há cem anos atrás, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, um grupo de pintores, arquitetos, músicos e poetas realizou, no Theatro Municipal de São Paulo, o evento que, anos mais tarde, passaria a ser considerado marco inaugural do modernismo brasileiro: a Semana de Arte Moderna.
Com o objetivo de romper com a tradição cultural da época – ligada às heranças europeias – e promover uma mudança radical nos rumos da produção artística nacional a partir da valorização das expressões culturais brasileiras, a Semana de 22 reuniu artistas como os irmãos e poetas Oswald e Mário de Andrade, e os grandes nomes da pintura Anita Malfati, Zina Aita e Di Cavalcanti. Envolto em polêmicas, vaias e aplausos, o evento foi decisivo para que os artistas até então chamados “futuristas” se engajassem de vez no projeto modernista de reinvenção cultural do Brasil.
Cem anos depois, a Semana de Arte Moderna e o legado por ela deixado tem sido alvos de diversas análises e questionamentos. O “patrocínio” do evento por parte da elite cafeeira paulista da época e a falta de diversidade e representação popular entre os participantes da Semana, são alguns dos pontos de crítica levantados por estudos e pesquisas.
Por outro lado, ao trazer as contradições à tona, mais do que desprestigiar o movimento modernista, as revisões sobre a Semana de 22 tem servido justamente para confirmar e rediscutir sua importância histórica em relação ao desenvolvimento cultural do país.
Contexto
Organizada pela elite urbana paulistana e bancada pela cafeicultura na zona rural do estado, a Semana de Arte Moderna foi realizada no ano em que o Brasil comemorava cem anos de independência e apenas 34 da abolição da escravatura.
Portanto, junto à nova expressão artística do país, havia também naquele momento a intenção de afirmar a urbanidade e modernidade como uma espécie de identidade da jovem nação , conforme explicou o professor do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da Universidade de São Paulo (USP), Luiz Armando Bagolin, em entrevista à Agência Brasil.
Inclusive, a proposta da Antropofagia, de “devorar” o que vem de fora para produzir uma arte autenticamente brasileira – que seria apresentada nos anos seguintes por Oswald de Andrade –, surge no momento em que boa parte da população de São Paulo era formada por famílias de imigrantes chegadas da Europa.
Segundo Bagolin, nos anos seguintes, o movimento inaugurado na Semana de 22 também “serviu como uma luva” ao projeto do Estado Novo, de Getúlio Vargas. Assim como os modernistas defendiam a união das influências do erudito e popular em suas obras, o Estado Novo apresentava a miscigenação de etnias e culturas como elemento fundamental da identidade do povo brasileiro.
Legado
A partir da Semana de 22, nomes como Tarsila do Amaral, Cândido Portinari, Heitor Villa-Lobos, Menotti del Picchia, Victor Brecheret e Sérgio Milliet se juntaram ao projeto mordenista e se tornaram expoentes da produção cultural brasileira em áreas que vão da literatura e artes plásticas até a arquitetura e urbanismo.
As obras e ideias do movimento inaugurado pela Semana influenciaram de tal modo as gerações seguintes que, hoje, cem anos depois, mesmo com as devidas e necessárias críticas, o aniversário do evento é comemorado em exposições, mostras e encontros promovidos por organizações e instituições de todo o país.