Redação
Nesta sexta-feira (11), completam-se 200 anos do nascimento de Maria Firmina dos Reis, a primeira escritora do Brasil, segundo a Biblioteca Nacional.
Nascida em 1822 na cidade de São Luís, no Maranhão, Maria Firmina teve uma vida marcada pelo enfrentamento das questões e preconceitos sociais da época, sobretudo os ligados ao racismo e a escravidão, e pelo pioneirismo em áreas como a literatura e a educação. Além de ser a primeira mulher a publicar um romance no país, a escritora e professora também foi a primeira mulher a ser aprovada em um concurso público no Maranhão e a primeira a criar uma escola mista no estado para que meninos e meninas estudassem juntos.
Publicado em 1859, o livro “Úrsula” é considerado o primeiro romance abolicionista brasileiro e a obra mais famosa de Firmina dos Reis. Embora o enredo do livro trate de um romance entre protagonistas brancos, o texto se destaca por ter sido o primeiro a apresentar o ponto de vista de personagens negros sobre a sociedade escravista brasileira. O poema “Navio Negreiro”, de Castro Alves, por exemplo, só foi publicado 10 anos depois.
“Uma maranhense”
Negra, pobre e filha ilegítima de mãe portuguesa e pai negro, Maria Firmina foi criada na vila de São José de Guimarães – atual município de Guimarães – no Maranhão. Ali se formou professora e, em 1847, com vinte e cinco anos de idade, foi aprovada em concurso público para a cadeira de instrução primária, tornando-se a primeira mulher a assumir o cargo no estado.
Foi graças à docência que a “mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e a conversação dos homens ilustrados” – como se apresenta no prefácio de seu primeiro livro – pode publicar os primeiros escritos em folhetins e jornais literários locais. O preconceito e a resistência à participação das mulheres na literatura e opinião pública da época (sobretudo as mulheres negras) fez com que Firmina dos Reis optasse por assinar a publicação de “Úrsula” sob o pseudônimo “Uma Maranhense”.
Além de “Úrsula”, a escritora também publicou o conto/novela “Gupeva”, em 1861, e o livro de poesias “Cantos à beira-mar”, em 1871. Embora as publicações já trouxessem o posicionamento antiescravista da autora, é no conto “A Escrava” (1887) que Maria Firmina confirma de vez o compromisso de sua literatura com a luta abolicionista. A autora também escreveu artigos para a imprensa local, participou de antologias e chegou a compor, em 1888, ano da abolição, o “Hino de Libertação dos Escravos”.
Legado
Ainda na década de 1880, após se aposentar como professora, Firmina dos Reis ainda inaugurou a primeira sala de aula mista e gratuita do Maranhão. A iniciativa, no entanto, gerou escândalo entre a sociedade local e as atividades tiveram que ser suspensas em menos de três meses.
Maria Firmina dos Reis morreu aos 92 anos, pobre, cega e praticamente ignorada em termos de reconhecimento literário. A obra da autora chegou a ficar anos esquecida no porão de uma biblioteca pública no Maranhão e só começou a ser valorizada a partir da década de 1970, com a redescoberta do seu trabalho por pesquisadoras e pesquisadores ligados aos estudos afro-brasileiros e de gênero.
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As próprias informações sobre a vida da escritora ainda são vagas e fragmentadas. Ninguém sabe, por exemplo, como era o rosto de Maria Firmina, pois até hoje não foi encontrada nenhuma pintura ou registro fotográfico da autora.
No bicentenário de Maria Firmina dos Reis, “Entre o indiferentismo glacial de uns e o riso mofador de outros” – conforme apresenta o prefácio de “Úrsula” – o legado da professora, escritora e ativista é considerado um convite à revisão da história e memória social brasileira.