Como em todos os anos, o 8 de março, Dia Internacional da Mulher, é marcado pela celebração das conquistas das mulheres em todo mundo e pela reivindicação de direitos. Desde 1975, quando a data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), o dia reforça o protagonismo das mulheres em processos de luta social que vão desde o combate à violência e à desigualdade (de gênero, raça e classe) até a defesa do meio ambiente.
Em 2023, das diversas bandeiras políticas sustentadas pelas mulheres, destaca-se também – e especialmente no Brasil – a luta pelo direito humano à comunicação. Nos últimos anos, sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), as mulheres comunicadoras estiveram entre os principais alvos de ataques, ameaças e perseguições no país.
Em 2020, por exemplo, mais de 56% das vítimas de ataques contra jornalistas em meios digitais eram mulheres, segundo levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). No ano seguinte, a associação registrou 127 ataques de gênero contra jornalistas e meios de comunicação, dos quais 91% foram direcionados a mulheres.
Para Manina Aguiar, coordenadora do programa “Rádio Mulher” do Centro das Mulheres do Cabo (CMC), em Pernambuco, o período “foi realmente um campo minado”.
“A gente teve que se apropriar cada vez mais dos nossos direitos e da nossa fala para que pudéssemos, inclusive, permanecer vivas para poder denunciar os desmandos do governo que estava instalado e que não queria ver nem ouvir a voz das mulheres” contou à Pulsar.
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Assim como Manina, a jornalista Geralda da Cunha, idealizadora do podcast “Prosa, Mulher e Política”, destaca que “as mulheres comunicadoras foram fundamentais nesse processo de mudanças políticas no Brasil, principalmente de resistência”.
“Com a queda de Dilma [Rousseff] e ascensão da extrema-direita e do bolsonarismo, nosso papel enquanto comunicadoras foi muito importante na perspectiva de manter todos os nossos trabalhos, nossas atuações e nossos programas, resistindo a todos os retrocessos. Nós fizemos do trabalho voluntário, da luta, da militância, a nossa missão de vida mesmo. Muitas vezes sem nenhum recurso, mas persistindo e tentando levar a lugares e pessoas a nossa mensagem, os nossos gritos de guerra, as nossas convicções e os nossos princípios”, comentou a radialista e também associada da Amarc Brasil.


Futuro de lutas
Mesmo com as mudanças nos rumos políticos após as eleições de 2022, a situação das mulheres comunicadoras no país ainda segue sob alerta. De acordo com a Abraji, só neste ano foram registrados 145 ataques com viés de gênero contra jornalistas no país. A maioria (51%) contêm discursos estigmatizantes que buscam difamar e constranger as vítimas e, destes, 67,6% foram cometidos por autoridades e figuras proeminentes.
Para Geralda da Cunha, os conteúdos e discursos de desinformação produzidos pela “indústria do ódio” ao longo dos últimos anos foram decisivos para a conformação deste cenário. Um quadro que, segundo ela, pode começar a ser alterado através da elaboração de um marco regulatório para a comunicação no país.
“É preciso uma discussão no sentido de ampliar a legislação e de ter leis que punam e coíbam esse espaço que hoje parece ser terra de ninguém, um espaço propício para a disseminação do discurso de ódio, do discurso da direita nazifascista, do discurso baseado em fake news. Essa é uma pauta e um desafio para nós comunicadoras, que pensamos uma comunicação para transformação, uma comunicação responsável e de fato calcada nos princípios de liberdade de expressão”, pontuou.
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Ainda sobre os desafios das mulheres comunicadoras nos próximos anos, Manina Aguiar defende a “equidade nos espaços de poder” como algo “de suma importância para que a democracia seja realmente praticada”. Neste sentido, a coordenadora da “Rádio Mulher” sugere, inclusive, a nomeação de uma mulher para substituir o atual ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil).
“Nós, comunicadoras comunitárias, radialistas, profissionais desse campo, temos ainda muito o que lutar e negociar com o atual governo no campo da comunicação, pois esse ministro que aí está posto não nos representa. É importante a gente continuar lutando para que este espaço, assim como em outros ministérios possa ser assumido por uma mulher competente sensível e preparada para a grandiosidade que é a missão de assumir um ministério da Comunicação”, defendeu.