Desde sexta-feira (23), os principais sistemas federais da pesquisa científica brasileira estão fora do ar. O apagão nas plataformas Lattes e Carlos Chagas causado pela queima de um servidor do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) tem afetado diretamente o trabalho de pesquisadores de todas as universidades do país – públicas e privadas – pois, além de reunir o currículo de milhares de pesquisadores, os sistemas também abrigam informações sobre a produção científica nacional em todas as áreas do conhecimento e operacionalizam chamadas públicas, editais de fomento à pesquisa e a gestão e pagamento de bolsas.
Segundo pesquisadores e organizações ligadas à pesquisa científica, a falha técnica reflete o descaso do atual governo com a ciência brasileira. No ano em que completa o 70º aniversário, o CNPq tem o menor orçamento das últimas duas décadas.
Em nota divulgada hoje, o CNPq informou que “o problema que causou a indisponibilidade dos sistemas já foi diagnosticado” e garantiu que “não há perda de dados da Plataforma Lattes”. O órgão também comunica aos pesquisadores que “o pagamento das bolsas implementadas não será afetado” e que todos os prazos de ações relacionadas ao fomento do órgão estão suspensos e serão prorrogados.
Ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), o CNPq é responsável pelo fomento à pesquisa no país. Cerca de 84 mil cientistas são financiados com recurso do órgão. A aprovação das bolsas, bem como a gestão e o pagamento dos recursos dependem diretamente da consulta aos currículos na Plataforma Lattes e da operação da Plataforma Integrada Carlos Chagas. Além disso, outros órgãos como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e agências de fomento ligadas a governos estaduais também utilizam as informações contidas na Plataforma Lattes como referência para realizar suas operações.
Repercussão
Nas redes sociais, o diretor do Sindicato Nacional dos Gestores Públicos em Ciência e Tecnologia (SindGCT) e presidente da Associação de Servidores do CNPq (Ascon), Roberto Muniz Barreto atribuiu a falha no sistema ao descaso e desmonte promovidos pelo governo.
“No momento em que mais o país precisa da ciência e tecnologia os sistemas do CNPq sofrem um apagão! Descaso e desmonte promovidos pelo governo. Não foi acidente”, escreveu.
Para Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) o “apagão do CNPq é o negacionismo em estado bruto” e é “resultado direto o da política de cortes de Bolsonaro”.
Segundo a associação, o CNPq conta, em 2021, com R$ 26 milhões para investir em fomento, quando precisaria de mais de R$ 150 milhões para atender a demanda das instituições de pesquisa. O déficit também acontece em relação às bolsas de estudo. De acordo com a ANPG, o CNPq investe cerca de R$ 943 milhões em bolsas, aproximadamente metade do valor reivindicado pelos pós-graduandos do país.
Leia mais: “Fake News” volta a ser pauta no Congresso
O deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ) e o economista, pesquisador e ex-BBB Gilberto Nogueira, o “Gil do Vigor”, também se pronunciaram nas redes. O parlamentar fez questão de lembrar que o orçamento do CNPq é o menor dos últimos vinte anos. Segundo Freixo: “Quando o Brasil mais precisa da ciência, bolsas e pesquisas estão paralisadas. É um projeto de destruição nacional”.
Na mesma linha, Gil fez uma série de publicações em que comenta: “É grave. É retrocesso. Estamos falando do trabalho árduo de milhares de brasileiros. Ciência brasileira salva vidas, mas parece que nosso governo atual não tem interesse por vidas e nem conhecimento”.
No dia 21 de julho, a ASCON e a ANPG realizaram uma mobilização nas redes em defesa do CNPq e contra os recentes cortes de bolsas que somam o valor de R$116 milhões. Para chamar atenção para a causa, desde então as organizações tem usado a hashtag #salveOCNPQ em seus pronunciamentos públicos.
Edição: Jaqueline Deister