Após quase três anos de espera, a Justiça do Equador deu início nesta semana ao julgamento do ciberativista sueco Ola Bini. A primeira audiência foi realizada nesta quarta-feira (19) e a estimativa do judiciário é que as sessões sigam até sexta-feira (21).
Reconhecido internacionalmente como um dos maiores especialistas em segurança da informação, Ola Bini foi preso em abril de 2019 e responde criminalmente à acusação de “acesso não consentido a um sistema informático”. O programador chegou a ficar detido por 70 dias até que a Justiça equatoriana acatasse o pedido de habeas corpus. Desde então, Bini está proibido de sair do país. Caso seja condenado, a pena para o suposto crime pode variar de três a cinco anos de prisão.
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Assim como no caso do jornalista e fundador do WikiLeaks, Julian Assange, o processo de Ola Bini tem sido acompanhado em todo o mundo por organizações ligadas à defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão e informação, como o Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH), a Anistia Internacional, a Human Rights Watch e a brasileira Artigo 19.
De acordo com a defesa do ativista, o caso tem sido marcado por uma série de irregularidades e desrespeitos a procedimentos diplomáticos e jurídicos. Em declaração à imprensa, o advogado de Bini, Carlos Soria, se mostrou otimista e informou que conta com mais de 100 testemunhas, documentos e peritos que comprovam a inocência do programador sueco.
Segundo a Artigo 19, o resultado do julgamento “pode ter profundas implicações para o desenvolvimento e uso de comunicações digitais seguras, nas quais as pessoas dependem em todo o mundo para exercer o direito de liberdade de expressão e seus direitos humanos”.
Entenda o caso
Defensor da privacidade da informação e da segurança na internet, Ola Bini vive no Equador desde 2013 e é um dos membros do Centro de Autonomia Digital, ONG que pesquisa e desenvolve ferramentas e técnicas para fortalecer a autonomia digital das pessoas.
Por ordem do governo de Lenín Moreno – especificamente da então ministra de Governo, María Paula Romo – o ativista foi preso no dia 11 de abril de 2019 no aeroporto Mariscal Sucre, em Quito. Na ocasião, o sueco estava prestes a embarcar para o Japão, onde, segundo ele, participaria de um evento de artes marciais.
Além da acusação de ataque a sistemas informáticos, o governo Moreno afirma que Bini, que é amigo de Julian Assange, estaria ligado ao jornalista em um suposto plano para desestabilizar o país através do hackeamento (invasão) de sistemas do governo. Contudo, nenhuma prova neste sentido foi apresentada até o momento.
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A prisão de Bini ocorreu pouco mais de um mês após o vazamento dos chamados “INA Papers”, documentos que expõem casos de corrupção do presidente Lenín Moreno e sua família. Horas antes da detenção do ciberativista, Julian Assange também era preso dentro da embaixada equatoriana em Londres após Lenín Moreno revogar o estado de asilo concedido pelo ex-presidente Rafael Correa ao fundador do WikiLeaks.
Irregularidades
De acordo com a defesa de Ola Bini, as irregularidades no processo judicial do ativista vão desde o modo como ocorreu a sua detenção até a falta de acesso às supostas provas do crime e a demora pelo julgamento.
Os advogados do ativista lembram que no momento em que ele foi detido, a polícia não apresentou mandado de prisão em seu nome e sequer esclareceu o motivo da ação. Além disso, por se tratar de um estrangeiro sem fluência no espanhol, as forças de segurança deveriam ter informado o consulado da Suécia sobre a prisão e garantido um tradutor para que fosse assegurado ao programador o direito de compreender as acusações contra ele, o que, segundo a defesa, não ocorreu.
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Os prazos legais estabelecidos pelas leis equatorianas também foram desrespeitados, segundo os advogados. Em julho do ano passado, a juíza Yadira Proaño chegou a ser afastada do caso por demorar mais de 200 dias para marcar uma audiência. O próprio julgamento, iniciado esta semana, havia sido marcado inicialmente para o dia 21 de outubro de 2021.
A defesa também lembra que os equipamentos do ativista foram confiscados pela polícia equatoriana no dia da prisão e divulgados como suspeitos mesmo sem qualquer prova incriminatória. Até hoje os dispositivos apreendidos estão sob posse do governo do Equador.
Edição: Jaqueline Deister