Redação
Nesta quarta-feira (25), quando se completam quatro anos do rompimento da barragem de rejeitos do Córrego do Feijão, de propriedade da mineradora Vale, em Brumadinho, Minas Gerais, atingidos da Bacia do Paraopeba e do Rio Doce realizaram um ato público em Belo Horizonte para reivindicar justiça e reparação para as vítimas.
Considerado o segundo maior crime socioambiental da história do Brasil – atrás apenas do rompimento da barragem também da Vale no município de Mariana, em 2015 – a tragédia de Brumadinho aconteceu no dia 25 de janeiro de 2019. O rompimento da barragem do Córrego do Feijão liberou, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), 12,7 milhões de metros cúbicos de rejeitos no Rio Paraopeba e matou 272 pessoas. Quatro anos após o crime, três pessoas seguem desaparecidas.
O “Ato pela reparação integral dos crimes nas Bacias Rio Doce e Paraopeba” foi organizado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e realizado na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.
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Além de atingidos da Bacia do Paraopeba e do Rio Doce, o ato contou com a presença de representantes do governo federal, como o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e a representante da Secretaria Geral da Presidência, Luisa Dulce. Também compareceram à manifestação representantes do Poder Judiciário como o procurador do Ministério Público Federal (MPF), Carlos Bruno Ferreira, e o procurador Geral de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Jarbas Soares Júnior.
De acordo com o MAB, além das indenizações individuais e coletivas e dos programas sociais, serviços públicos e obras nos territórios impactados, a reparação dos danos causados às comunidades afetadas pelo crime passa necessariamente pela responsabilização e punição da Vale, que até hoje não ocorreu.
“Quanto mais tempo demora essa punição, aumenta o risco de reincidência de crimes e a ‘revitimização’ das pessoas atingidas, pois há o aumento da vulnerabilidade social e o aprofundamento das situações de violação dos direitos humanos como: insegurança alimentar e hídrica; danos socioeconômicos (no trabalho e renda, agricultura, pecuária), aumento de problemas de saúde física e mental, incluindo um grande número de suicídios”, explica Fernanda Portes, integrante da coordenação do MAB.
Desde os primeiros dias do governo Lula, o MAB tem cobrado a participação dos atingidos na criação de uma política de direitos e reparação para os atingidos por barragens. Estabelecida no Projeto de Lei 2788/19, a chamada Política Nacional dos Direitos das Populações Atingidas (PNAB) já foi aprovada na Câmara dos Deputados e, atualmente, tramita atualmente na Comissão de Infraestrutura do Senado.
Segurança
Outro ponto levantado pelo movimento é a necessidade urgente de mudança “do padrão criminoso de exploração de minério” no país. Segundo Fernanda, mesmo após as tragédias de Mariana e Brumadinho, as práticas de segurança dos empreendimentos no país seguem sem a menor efetividade do ponto de vista da proteção da vida.
“O risco continua, pois ocorrem crimes semelhantes com outras empresas e as barragens de rejeito, todas com tempo de validade, funcionam como bombas-relógio sobre a cabeça dos povoados e cidades. Em Congonhas [em Minas Gerais], a Barragem de rejeito ‘Casa de Pedra’ (CSN) é um caso típico desse ‘padrão criminoso’”, denunciou.
Considerada a maior barragem urbana da América Latina, a “Casa de Pedra” acumula cerca de 103 milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração e está localizada a cerca de 250 metros de um dos bairros do município de Congonhas. A estrutura da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) é classificada pelo Sistema Integrado de Gestão de Barragens de Mineração (SIGBM) da Agência Nacional de Mineração (ANM) como de alto risco e dano potencial associado.
De acordo com relatórios da Agência Nacional de Águas (ANA), somente em 2021, houve 50 incidentes e acidentes envolvendo barragens no Brasil. Os casos ocorreram em 16 estados, a maioria na região central do país. Os relatórios também apontam que Outro número significativo de 187 barragens localizadas em 22 estados do país encontram-se em estado crítico.
Justiça
O inquérito da Polícia Federal (PF) que apurou responsabilidades pelo crime em Brumadinho foi concluído em novembro de 2021 com o indiciamento de 19 pessoas, além da mineradora Vale e a Tüv Süd, empresa alemã que assinou o laudo de estabilidade da barragem que se rompeu. Contudo, o relatório final com o nome dos 19 indiciados foi encaminhado ao MPF e permanece até hoje em sigilo. Até o momento, a investigação não teve desdobramentos em nenhum processo criminal.
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No último dia 18, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) ministra Rosa Weber, determinou que a Justiça Federal em Minas Gerais prossiga imediatamente com o processo penal sobre o rompimento, pois, segundo ela, “há ‘risco iminente’ de prescrição de crimes ambientais descritos na peça de acusação”.
Há dois dias, um outro processo – este movido pelo MPMG em fevereiro de 2020 com base em investigações da Polícia Civil – foi reapresentado pelo MPF e aceito pela juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2ª Vara Criminal Federal. A denúncia elaborada pelo MPMG e agora ratificada pelo MPF aponta o indiciamento de 16 pessoas sendo 11 ligadas à Vale e cinco à Tüv Süd.
De acordo com o processo, os 16 denunciados devem responder por crimes contra a flora, a fauna e pelo crime de poluição, além do crime de homicídio qualificado (270 vezes).
Vale e Tüv Süd também foram denunciadas e, se condenadas, podem ser penalizadas com diversas sanções. A denúncia aponta que um conluio entre as empresas resultou na emissão de declarações de condição de estabilidade falsas que tinham como objetivo esconder a real situação da barragem e permitir que as atividades da mineradora pudessem ser levadas adiante.
* Com informações do Coletivo de Comunicação do MAB e da Agência Brasil
Edição: Jaqueline Deister