Um novo escândalo de corrupção no governo Bolsonaro tem ocupado as manchetes de jornais e portais de notícia em todo país. O “Bolsolão do MEC”, apelido dado ao suposto esquema operado por um gabinete paralelo dentro do Ministério da Educação (MEC), começou a ser revelado nas últimas semanas pela imprensa e já tem motivado ações de políticos e organizações sociais junto a órgãos como a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Ministério Público Federal (MPF) e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Na semana passada, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, líderes da Igreja Ministério Cristo para Todos, frequentavam o gabinete do ministro da Educação, Milton Ribeiro, e facilitavam ilegalmente o acesso de prefeitos a verbas do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE) para seus municípios.
Na terça-feira (22), a atividade do “gabinete paralelo do MEC” foi confirmada pela Folha de S. Paulo através de um áudio vazado do próprio ministro Milton Ribeiro. No arquivo, Ribeiro não só assume a existência do esquema, como também diz que priorizou “os amigos dos pastores” a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL). A prática de favorecimento ocorreria desde janeiro de 2021. Ainda segundo o áudio do ministro, em troca da atuação no MEC, os pastores dariam apoio ao governo nas igrejas.
Ainda na terça-feira, outra reportagem do Estado de S. Paulo apontou que Gilmar e Arilton chegaram a pedir pagamentos em ouro a prefeitos em troca da liberação de recursos federais para construção de creches e escolas. Segundo o jornal, a informação teria sido certificada pelo prefeito de Luis Domingues, no Maranhão, Gilberto Braga (PSDB).
De acordo com o prefeito, a negociação teria ocorrido em abril de 2021, durante um encontro em um restaurante de Brasília. Na ocasião, o pastor Arilton Moura teria pedido o pagamento de R$ 15 mil antecipados pela intermediação com o MEC e mais um quilo de ouro quando os recursos fossem liberados. De acordo com a cotação desta quarta-feira, o valor do quilo do ouro no país varia entre R$ 302 mil e R$ 309 mil.
Segundo o Estadão, os encontros de prefeitos promovidos por Arilton e Gilmar no MEC levaram a um total de pagamentos e empenhos (reserva de valores) de R$ 9,7 milhões. Ainda conforme o jornal, desde o início de 2021, ao menos 48 municípios foram contemplados com verbas após os encontros com os pastores e 26 deles obtiveram recursos próprios do FNDE, enquanto o restante recebeu dinheiro de emendas do orçamento secreto.
Repercussão
Desde que as revelações sobre o bolsolão do MEC vieram à tona, parlamentares e movimentos sociais tem se manifestado em relação ao caso e cobrado da Justiça que investigue o envolvimento do ministro Milton Ribeiro e o presidente Jair Bolsonaro no esquema.
Ainda na terça-feira, o líder da minoria na Câmara, o deputado federal Alencar Santana Braga (PT-SP), e o senador Fabiano Contarato (PT-ES) apresentaram ao STF dois pedidos de abertura de inquérito contra Bolsonaro e Ribeiro. A relatora da notícia-crime no Supremo será a ministra Cármen Lúcia. Os representantes do PT também solicitaram que a PGR apure as denúncias e responsabilize os envolvidos.
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Na mesma linha, a deputada federal Sâmia Bomfim, líder do PSOL na Câmara, afirmou que a bancada do partido deve acionar o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União (TCU) para que investiguem o presidente e o ministro por improbidade administrativa e crime de responsabilidade.
O deputado Professor Israel (PV-DF), por sua vez, apresentou ainda na terça-feira um requerimento solicitando a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar o esquema de verbas operado pelo gabinete paralelo do MEC. Para que a comissão seja instalada, são necessárias as assinaturas de pelo menos 171 deputados, 26 senadores e a autorização do presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Em nota, associações estudantis como a União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) classificaram a atuação do MEC como um “grande balcão de negócios” a serviço de esquemas eleitorais do presidente.
“No momento em que vivemos a maior crise da educação brasileira, quando milhares de jovens evadem das escolas e universidades e pós-graduandos padecem com 9 anos de bolsas congeladas, realidade que exigiria do Ministro um grande esforço para reverter esse cenário, vimos o ministério ser transformado num grande balcão de negócios a céu aberto para alimentar esquemas eleitorais do presidente”, afirmam os estudantes.
Sobre as providências a serem tomadas pelas instituições e órgãos responsáveis, as entidades estudantis pedem a demissão de Ribeiro do cargo de ministro da Educação e reforçam: “É imperioso que o Congresso Nacional, em sua atividade de fiscalização do Executivo, e o Ministério Público Federal e autoridades judiciárias tomem providências para cessar esse descalabro”.
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MEC
Na terça-feira, o Ministério da Educação emitiu uma nota em que rebate as acusações de que o ministro Milton Ribeiro teria favorecido pastores e recebido pedidos de tratamento preferencial por parte do presidente Jair Bolsonaro.
Segundo o documento, “diferentemente do que foi veiculado, a alocação de recursos federais ocorre seguindo a legislação orçamentária, bem como os critérios técnicos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE)”. O ministério também destacou no texto que “não há nenhuma possibilidade de o ministro determinar alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou estado”.
Por fim, a nota defende o chefe do Executivo sob a argumentação de que ele “não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem”.