Redação
Mais de quatro mil pessoas representantes de governos, órgãos regulatórios, empresas digitais, universidades e organizações da sociedade civil se reuniram em Paris, na França, na última semana, para participar da primeira Conferência Global sobre as ameaças à integridade da informação e liberdade de expressão nas plataformas de redes sociais.
Com o título “Internet for Trust” – ou “Por Uma Internet Confiável” – o evento foi promovido pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e teve como objetivo desenvolver as primeiras diretrizes internacionais para a regulamentação das mídias sociais.
De acordo com a diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, a tarefa de regular o mundo digital promovendo a confiabilidade da informação e os direitos humanos online é um dos desafios “mais complexos e decisivos do nosso tempo”.
Segundo Azoulay, pelo menos 55 países estão trabalhando em iniciativas regulatórias para abordar a propagação de conteúdos falsos e discursos de ódio. Porém, ainda segundo Azoulay, parte dessas legislações correm o risco de violar direitos humanos, como o direito à liberdade de expressão e opinião. Na opinião da diretora-geral da Unesco, se as iniciativas regulatórias forem desenvolvidas isoladamente em cada país, estarão fadadas ao fracasso.
Para o chefe da área de Liberdade de Expressão e Segurança de Jornalistas da Unesco, Guilherme Canela, devido a complexidade do tema, é fundamental que governos, empresas e sociedades se esforcem para traçar acordos comuns.
“A gente tem um desafio enorme, que é o seguinte: tem um certo consenso em relação ao problema, nós precisamos enfrentar esse problema. Mas não há consenso em relação a como enfrentar esse problema. Por isso, a Unesco chamou esse debate global com todos esses atores para apresentar uma proposta rascunho, uma proposta em elaboração”, explicou.
Além de Canela, estiveram presentes na Conferência o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, a jornalista Patrícia Campos Mello, o influenciador digital Felipe Neto e a jornalista Bia Barbosa, da Coalizão Direitos na Rede (CDR).
A comitiva brasileira ainda contou com representantes do governo como o secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social (Secom), João Caldeira Brant, o procurador-Geral da União (PGU), Marcelo Eugenio Feitosa Almeira, e a assessora especial do ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Estela Aranha.
Equilíbrio
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não compareceu ao evento, mas enviou uma carta que foi lida logo no primeiro dia (22), na abertura da Conferência. No documento, Lula defendeu a regulação das chamadas big techs, o combate à concentração do mercado digital e a promoção da autonomia dos países em desenvolvimento na área.
“Precisamos de equilíbrio. De um lado, é necessário garantir o exercício da liberdade de expressão individual, que é um direito humano fundamental. De outro lado, precisamos assegurar um direito coletivo: o direito de a sociedade receber informações confiáveis, e não a mentira e a desinformação. Também não podemos permitir que a integridade de nossas democracias seja afetada pelas decisões de alguns poucos atores que hoje controlam as plataformas”, escreveu o presidente.
Lula também citou o ataque às sedes dos Três Poderes no dia oito de janeiro, que, segundo ele, “foi o ápice de uma campanha, iniciada muito antes, que usava como munição a mentira e a desinformação”.
Em palestra realizada no dia seguinte à leitura da carta, o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, também defendeu o equilíbrio em relação à regulamentação das plataformas. Segundo ele, o combate à desinformação e ao discurso de ódio não pode abrir portas para atos de censura. Ao mesmo tempo, a defesa da liberdade de expressão não deve ser convertida em arbitrariedade.
“Nós estamos diante de uma guerra da verdade contra a mentira, da confiança contra o descrédito, do bem contra o mal. O grande problema é que o mal às vezes se disfarça como bem, fingindo ser liberdade de expressão”, afirmou o ministro.
Diretrizes
De acordo com a Unesco, o documento intitulado “Diretrizes para regulamentar plataformas digitais: uma abordagem multissetorial para salvaguardar a liberdade de expressão e o acesso à informação”, segue em consulta pública e deve ser divulgado em setembro. Segundo a agência, as recomendações serão usadas por governos, órgãos regulatórios e judiciais, sociedade civil, mídia e empresas digitais para ajudar a melhorar a confiabilidade das informações online, promovendo a liberdade de expressão e os direitos humanos.
No Brasil, desde 2020 está em análise no Congresso Nacional o Projeto de Lei 2630/20. Apelidada de “PL das Fake News”, a proposta elenca uma série de normas relativas à transparência de redes sociais e de serviços de mensagens privadas, sobretudo no que se refere à responsabilidade dos provedores pelo combate à desinformação e pelo aumento da transparência na internet.
* com informações da ONU News e da Agência Brasil
Edição: Jaqueline Deister