Referência em educação popular no Nordeste, o Centro de Formação Paulo Freire (CFPF), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) em Pernambuco, foi atacado na madrugada do último domingo (13) por um grupo de supostos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL). O CFPF fica localizado no assentamento Normandia, na área rural do município de Caruaru, no Agreste pernambucano.
Segundo o movimento, por volta das três horas da manhã, quatro pessoas vestidas com camisas amarelas teriam aproveitado a realização de uma festa de vaquejada em local próximo ao Centro para invadir a unidade, pichar as paredes de espaços coletivos com o símbolo da suástica nazista e com a palavra “mito”, em referência ao presidente derrotado nas eleições deste ano. A casa onde reside a coordenadora do Centro também foi arrombada e incendiada durante o ataque.
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O incêndio foi controlado por militantes do próprio movimento que foram alertados e se dirigiram ao local. Ninguém ficou ferido, mas a casa foi parcialmente queimada e parte do telhado, das camas e pertences foram destruídos pelo fogo. O caso foi registrado da delegacia de Polícia Civil de Caruaru.
“Lamentamos muito, ter que fazer este informe, já que saímos de uma jornada eleitoral polarizada e acirrada. O Brasil e o povo brasileiro clamava por atitudes e empenho para resgatar a democracia, os preceitos constitucionais do estado democrático de direito e uma postura enérgica contra a fome, contra a violência, contra o ódio e contra todo o tipo de preconceito. Os bolsonaristas foram derrotados nas eleições, mas uma minoria, movida pela intolerância, preconceito e ódio de classe, de raça e gênero, não aceitaram os resultados da democracia e estão querendo nos impor um terceiro turno”, declarou o MST em nota.
“Cuidar e proteger nossas estruturas e nossas lideranças, contra a ira do ódio e do preconceito e da intolerância, dos grupos fascistas. Contra todo o tipo de ódio e intolerância, venceremos!”, concluiu o movimento.
Deputada estadual eleita este ano pelo Partido dos Trabalhadores (PT), a militante do MST-PE Rosa Amorim publicou um vídeo nas redes sociais com imagens dos estragos causados pelos vândalos bolsonaristas. Segundo a futura parlamentar: “O MST e o Centro de Formação Paulo Freire não serão calados por fascistas e nazistas”
“O MST resiste às tentativas de silenciamento e ameaças desde a sua criação, e nós continuaremos resistindo e defendendo os direitos do povo brasileiro”, afirmou.
A Pulsar Brasil entrou em contato com a Polícia Civil de Pernambuco para ter informações sobre a investigação do caso, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para a manifestação do órgão.
Centro de Formação
Criado em 1999, o Centro de Formação Paulo Freire já formou mais de 100 mil pessoas em diversas áreas do conhecimento através de convênios com instituições como a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
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Entre os cursos ofertados na unidade, destaca-se o Curso Técnico de Práticas em Agroecologia – conhecido também como “Pé no Chão” –, que capacita agricultores familiares a produzir alimentos saudáveis. Atualmente, o Centro conta com 52 alojamentos, auditório para mais de 500 pessoas e é considerado o maior centro rural popular do Nordeste.
Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, o CFPF chegou a ser alvo de uma ordem de reintegração de posse movida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e pela Advocacia Geral da União (AGU). Mas, segundo o próprio MST, a ação foi barrada “por uma extensa rede de solidariedade vinda do Brasil e de outros lugares do mundo” e desde então o processo está parado aguardando procedimento do Incra.
De acordo com o movimento, o território em litígio está há 20 anos sob gestão de uma associação comunitária composta por membros das famílias do assentamento Normandia. As terras ocupadas pelo CFPF foram cedidas em comum acordo pelas próprias famílias para benefício coletivo.
No local, além do CFPF também existem uma igreja católica, uma creche e uma Academia da Cidade, construída pelo governo de Pernambuco. O território abriga, ainda, uma agroindústria de beneficiamento de batata doce, inhame, macaxeira e carne de boi cultivadas por trabalhadores de todo o estado. Os alimentos são fornecidos para a merenda de escolas e creches de prefeituras do Agreste, Zona da Mata e litoral pernambucano, incluindo escolas da capital Recife.
Edição: Jaqueline Deister