Redação
O Congresso Nacional impôs, na última quarta-feira (24), uma série de ataques contra políticas públicas em defesa do meio ambiente no Brasil.
Em apenas um dia foram aprovados:
- O texto-base do projeto de lei de conversão que estabelece o esvaziamento dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas;
- O requerimento de urgência para a votação do projeto de lei do marco temporal na demarcação de terras indígenas (PL 490/07);
- A medida provisória que altera a Lei da Mata Atlântica e flexibiliza ferramentas de controle ao desmatamento no bioma (MP 1150/22).
No primeiro caso, a comissão mista sobre a Medida Provisória 1.154/23 admitiu, com 15 votos a favor e 3 contra, a proposta de reorganização dos ministérios do Governo Federal feita pelo relator, deputado Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL). O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e o Ministério dos Povos Indígenas foram os principais afetados pelas mudanças previstas no texto.
Esvaziamento
De acordo com a proposta, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que no governo Bolsonaro saiu do Meio Ambiente e passou para a Agricultura, passará, agora, a ser vinculado ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. O CAR funciona como uma base de dados que serve tanto para o cadastro de imóveis rurais como para o controle do desmatamento em áreas rurais.
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O controle da Agência Nacional de Águas também será transferido, mas para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR). A pasta é comandada, hoje, por Waldez Góes, ministro filiado ao PDT, mas que foi indicado por influência do União Brasil. O MIDR também assumirá o controle da política nacional sobre recursos hídricos.
O Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa) e o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir), hoje na pasta do Meio Ambiente, vão para o Ministério das Cidades — que, no campo do saneamento, atuará inclusive em terras indígenas. Atualmente, a pasta é dirigida por Jader Barbalho Filho, ministro indicado pelo MDB.
No caso dos Ministério dos Povos Indígenas, chefiado pela ministra Sônia Guajajara, o golpe foi ainda mais violento. A proposta de Bulhões Jr. retira da pasta a gestão das demarcações de Terras Indígenas (TI) e a transfere para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, sob comando de Flávio Dino.
Segundo a ministra Sônia Guajajara, as emendas propostas pelo relator “anulam a representação brasileira no enfrentamento da crise climática e preservação ambiental”.
“Acatar as emendas e excluir a demarcação de terras do Ministério dos Povos Indígenas vai contra os objetivos globais de enfrentamento à crise climática. Territórios indígenas protegidos são fundamentais para conter a emergência climática”, publicou a ministra em rede social.
Em discurso na Câmara dos Deputados, a ministra Marina Silva também criticou o texto aprovado no Congresso. Segundo ela, “o povo brasileiro elegeu o presidente Lula, mas parece que o Congresso quer reeditar o governo Bolsonaro”.
Após a aprovação da Comissão Mista, o parecer de Bulhões Jr. seguirá para os plenários da Câmara dos Deputados e do Senado. O Legislativo precisará concluir a análise até o dia 1° de junho, quando a medida provisória perderá validade.
Marco Temporal
Ainda na quarta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou, por 324 votos a favor e 131 contra, o requerimento de urgência do PL 490/07, que trata da chamada Tese do Marco Temporal. O PL restringe a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses povos em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
Segundo a proposta, para que sejam consideradas terras ocupadas tradicionalmente, os indígenas deverão comprovar que, na data de promulgação da Constituição, elas eram, ao mesmo tempo, habitadas em caráter permanente e usadas para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais e à reprodução física e cultural.
De acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o projeto deve entrar em votação na próxima semana.
Segundo a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), a proposta do marco temporal “é um ataque a vida, ao planeta e não só aos nossos povos. É uma questão humanitária”.
“Querem seguir nos matando. Mudaram as armas, mas 1.500 ainda existe em Brasília. Um genocídio legislado e vai ter luta!”, escreveu a deputada nas redes sociais.
Mata Atlântica
Por último, também na quarta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou a medida provisória que altera a Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/06) e facilita o desmatamento no bioma (MP 1.150 de 2022).
Apresentada no ano passado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, a MP já havia sido analisada pela Câmara e pelo Senado. Na segunda Casa, inclusive, foi retirado o dispositivo que se incidia sobre a Lei da Mata Atlântica. Com isso, a medida provisória previa, inicialmente, apenas a alteração sobre regularização ambiental estabelecida pela Lei nº 12.651/12, com a prorrogação da inscrição no Programa de Regularização Ambiental (PRA) em 180 dias.
Contudo, na segunda análise da Câmara – após as mudanças feitas no Senado – o relator do texto, deputado federal e ex-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) Sérgio Souza (MDB-PR), adicionou dispositivos à proposta. Entre eles, a permissão do desmatamento em vegetação primária e secundária que apresentam um estado avançado de regeneração.
Na nova passagem pela Câmara também foram reduzidos dispositivos para salvaguardar a ocupação de áreas de preservação permanente urbanas (APPs), o que poderá intensificar a ocupação de locais de risco, como morros e encostas.
O texto segue, agora, para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que ainda poderá vetar a MP.
*Com informações da Agência Câmara, Agência Senado, Poder 360, Congresso em Foco e G1.
Edição: Jaqueline Deister