Redação
Não existe solução para a crise climática sem a participação dos povos originários na proteção das florestas, de seus territórios e de seus modos de vida. Este é o principal recado que as delegações brasileiras de representantes de povos indígenas e quilombolas têm dado ao mundo durante a 27ª Conferência das Partes (COP-27) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
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Iniciado no último domingo (6), na cidade de Sharm el-Sheikh, no Egito, o evento reúne representantes de governos e lideranças da sociedade civil de praticamente todos os países para discutir estratégias de enfrentamento e adaptação ao desafio global das mudanças climáticas. Chamada de “COP da implementação”, a 27ª edição do encontro tem como principal objetivo colocar em prática os compromissos assumidos pelos países em relação à redução das emissões de carbono e à proteção das populações vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas.
Entre os movimentos sociais brasileiros representados na Conferência estão a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Coalizão Negra por Direitos e a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq). O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também participará do evento à convite do presidente do Egito, Abdel Fatah al-Sissi, e de governadores dos estados da Amazônia Legal.
Desmatamento
De acordo com a Apib, a prioridade da delegação enviada à COP-27 é pautar a urgência da demarcação das Terras Indígenas (TIs) no Brasil. Segundo a associação, “as TIs são as áreas com maior biodiversidade e com vegetação mais preservadas, visto que são territórios protegidos e manejados pelos povos originários”. Como prova, os indígenas apontam o levantamento feito este ano em parceria com o Instituto de Pesquisa Ambiental do Amazonas (Ipam) que revela que, enquanto 29% do território ao redor das TIs está desmatado, dentro das áreas o desmatamento é de apenas 2%.
“No Brasil não há solução para a crise climática sem a demarcação de terras e, consequentemente, a proteção dos povos indígenas. Nós temos uma relação íntima com a Mãe-natureza e vemos de perto os efeitos da destruição ambiental que Bolsonaro causou”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da APIB.
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Na quarta-feira (9), o líder indígena participará da conferência no painel “Transição governamental e política socioambiental brasileira”.
Outra discussão importante aos povos indígenas durante a COP é a promessa de retomada do Fundo Amazônia, programa de cooperação internacional que destinava ajuda financeira para redução do desmatamento no Brasil. O Fundo foi criado em 2008, mas em 2019, com o aumento do desmatamento e a imposição de mudanças pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), países como a Noruega e a Alemanha suspenderam as transferências de recursos que somavam cerca de US$ 1 bilhão.
No último dia 31, assim que foi confirmada a eleição de Lula para a presidência da República, a Noruega anunciou que reativará o Fundo Amazônia. Segundo Eunice Kerexu, coordenadora executiva da Apib, o retorno do petista ao governo “traz alívio e otimismo” para ativistas e organizações indígenas.
“Com Lula temos um cenário mais otimista, mas a luta não para. Vamos continuar batalhando pela demarcação de terras indígenas e a derrubada da tese do Marco Temporal. Assim como a Noruega, é importante também que mais países participem do debate e voltem a dialogar com o Brasil para juntos solucionarmos a crise climática”, ressaltou Kerexu.
Racismo ambiental
Segundo a Conaq a participação dos quilombolas na COP tem como principal objetivo denunciar a “invisibilidade da população quilombola na agenda climática e ambiental”.
“O racismo e a violência racial estruturam o processo histórico de privação de políticas públicas e de direitos que nos afeta. Vemos o racismo ambiental se manifestar nos nossos quilombos que estão expostos a eventos climáticos extremos e a áreas de risco de desastre ambiental. Vimos as consequências das inundações e das queimadas recentemente ocorridas no Brasil dentro dos nossos Quilombos”, publicou a organização em rede social.
O racismo ambiental no Brasil também tem sido denunciado no encontro pela delegação da Coalizão Negra por Direitos. Segundo o movimento, os principais pontos que têm sido apresentados pela comitiva no evento são: a redução das desigualdades para que o Brasil alcance a justiça ambiental, a implantação de metas ambientais que levem em conta as ameaças à população negra, a valorização dos territórios quilombolas e a escuta das pautas do Sul Global.
“É necessário considerar os conhecimentos dos povos em sua natureza, em especial as diferentes vozes das mulheres, das juventudes, das quilombolas, das indígenas e das populações negras diaspóricas periféricas”, explicou a Coalizão.
Edição: Jaqueline Deister