Redação
Nesta terça-feira (23), foram abertos os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados que investigará a atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Instalada na última quarta-feira (17), a CPI do MST será composta por uma maioria de parlamentares de oposição ao governo federal. Dos 27 membros titulares da comissão, 20 integram o bloco de oposição. Ao todo, incluindo os membros suplentes, dos 54 deputados que integram a CPI, 40 pertencem à chamada “bancada ruralista” da Câmara.
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Além da maioria de membros, a oposição também controlará a mesa diretora da comissão. A presidência ficará por conta do deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS) e a relatoria de Ricardo Salles (PL-SP), ambos investigados pela Justiça – Zucco, por incentivo a atos antidemocráticos durante as Eleições 2022, e Salles por corrupção e exportação ilegal de madeira enquanto ocupou o cargo de Ministro do Meio Ambiente durante o governo Bolsonaro.
Para os cargos de 1º, 2º e 3º vice-presidente foram indicados, respectivamente, os deputados Kim Kataguiri (UB-SP), Delegado Fábio Costa (PP-AL), e Evair Vieira de Mello (PP-ES).
Do lado da base de apoio ao governo, participam da comissão os parlamentares: Daiana Santos (PCdoB-RS), Max Lemos (PDT-RJ), Nilto Tatto (PT-SP), Padre João (PT-MG), Paulão (PT-AL), Valmir Assunção (PT-BA) e Sâmia Bomfim (PSOL-SP). Confira a lista completa.
Suspeitos
Amigo pessoal da família de Jair Bolsonaro, Tenente Coronel Zucco virou alvo de apuração da Polícia Federal, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na última quarta-feira (18), por suspeitas de ter incentivado atos antidemocráticos no ano passado, após a vitória de Lula sobre Bolsonaro, nas eleições de 2022.
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De acordo com despacho do ministro Alexandre de Moraes, Zucco “estaria perpetrando crimes mediante patrocínio e incentivo a atos antidemocráticos, seja em território gaúcho, seja na cidade de Brasília”.
Em 2022, Zucco também foi investigado por suposto apoio ao fechamento de estradas após a derrota de Jair Bolsonaro nas urnas. A Polícia Federal também apura publicações do deputado feitas em suas redes sociais após as eleições.
Salles, por sua vez, é investigado pela Justiça do Pará desde 2021 – junto com outros nove ex-ocupantes de cargos de confiança no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e no Ministério do Meio Ambiente – por crimes contra a administração pública como corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e, especialmente, facilitação ao contrabando.
Na primeira reunião da CPI, quando foram definidas a organização e formação da comissão, a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) criticou a indicação do ex-ministro para a relatoria. Segundo ela, Salles tem interesse econômico relacionado à pauta, em razão de ter entre seus financiadores de campanha usineiros e madeireiros.
“Ele tem um interesse ideológico, político e econômico, pois os financiadores do deputado Ricardo Salles querem que ele preste contas do dinheirão que o trouxe até aqui”, afirmou a deputada.
Bomfim, também destacou os interesses ideológicos do relator:
“Quando foi candidato a deputado federal em 2018, Salles fez campanha baseada na criminalização do MST. Na época, ele foi investigado porque dizia abertamente que iria fuzilar os militantes do movimento”, denunciou.
Criminalização
Em nota publicada na última quinta-feira (18), um dia após a instalação da CPI, o MST afirma que a comissão “representa uma tentativa de criminalizar o MST e pressionar o governo”. Em relação aos nomes escolhidos para a mesa diretora, o movimento ressalta que Ricardo Salles e Tenente Coronel Zucco “não possuem legitimidade para conduzir qualquer tipo de investigação contra um Movimento que caminha rumo aos seus 40 anos, levantando a bandeira histórica de combate à concentração de terras no Brasil”.
Segundo o texto, a tentativa de criminalização do movimento faz parte de uma “estratégia para omitir as reais mazelas do campo brasileiro” como desmatamento, grilagem de terra, queimadas, violência no campo, uso de mão de obra análoga à escravidão, destruição e contaminação dos bens naturais pelo uso de agrotóxicos.
“Somente neste ano, 918 vítimas de trabalho escravo foram resgatadas, um recorde em 15 anos. Estes são os temas que deveriam ser alvo de investigação”, destaca o movimento.
Na nota, o MST também ressalta a histórica atuação em defesa da Constituição Federal, sobretudo no que se refere ao cumprimento da “função social da propriedade”.
“Tal princípio atende a critérios produtivos, ambientais e trabalhistas e devem ser combinados. Portanto, segurança jurídica se alcança ao se cumprir a Constituição. As famílias Sem Terra acampadas fazem a luta digna por terra, teto e trabalho, direitos assegurados na Carta Magna”, pontua.
“Portanto, sabendo que nossa luta é justa e que, nesta CPI, não somos nós os criminosos, dela participaremos para apresentar a Reforma Agrária que o Brasil precisa. Nesta comissão, contaremos com a solidariedade não somente de valorosas e valorosos parlamentares, mas também com o apoio de toda a sociedade. Juntos, iremos superar mais uma tentativa de criminalizar nossa luta”, conclui o documento.
*Com informações do Brasil de Fato, Agência Câmara e O Globo.
Edição: Jaqueline Deister