Redação
“A ONU precisa cumprir seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno. Mas só o fará se seus membros tiverem a coragem de proclamar sua indignação com a desigualdade e trabalhar incansavelmente para superá-la”. Foi com essas palavras que, nesta terça-feira (19), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concluiu seu discurso na abertura da 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque, nos Estados Unidos.
Em sua oitava participação na abertura do encontro, o presidente tratou de temas como a fome no mundo, as mudanças climáticas, conflitos armados, liberdade de imprensa e a participação dos países emergentes nas principais instâncias da governança global. Segundo Lula, a humanidade está mergulhada “em um turbilhão de crises múltiplas e simultâneas” cuja raiz está na desigualdade social.
Em tom incisivo, o petista criticou a “paralisia”, o “imobilismo” e a “representação desigual e distorcida” na direção de organizações como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e as próprias Nações Unidas. De acordo com Lula, “falta vontade política daqueles que governam o mundo” para enfrentar o problema de desigualdade.
“A fome, tema central da minha fala neste Parlamento Mundial 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos, que vão dormir esta noite sem saber se terão o que comer amanhã. O mundo está cada vez mais desigual. Os 10 maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade […] É preciso antes de tudo vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural. Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo”, afirmou.
“Correção de rumos”
O tema das desigualdades sociais entre as populações dos “países ricos” e os do “Sul Global” esteve presente ao longo de praticamente todo o discurso de Lula. Em relação às mudanças climáticas, por exemplo, o chefe de Estado brasileiro enfatizou que “agir contra a mudança do clima implica pensar no amanhã e enfrentar desigualdades históricas”.
Segundo Lula, “os países ricos cresceram baseados em um modelo com altas taxas de emissões de gases danosos ao clima”. Por isso, “a emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implementação do que já foi acordado” em tratados internacionais como o Acordo de Paris e o Marco Global da Biodiversidade.
“São as populações vulneráveis do Sul Global as mais afetadas pelas perdas e danos causados pela mudança do clima. Os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo o carbono lançado na atmosfera. Nós, países em desenvolvimento, não queremos repetir esse modelo”, pontuou.
Leia também: Passagem de ciclone pelo Rio Grande do Sul provoca mais de 20 mortes e centenas de desabrigados
Multilateralismo
Outro ponto de destaque do discurso de Lula foi a defesa do “multilateralismo” e de uma maior participação de países da América Latina, África e Ásia nas grandes decisões globais. Segundo Lula, ao longo das últimas décadas o princípio da igualdade soberana entre as nações “vem sendo corroído”.
“Nas principais instâncias da governança global, negociações em que todos os países têm voz e voto perderam fôlego. Quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema, e não da solução. No ano passado, o FMI disponibilizou 160 bilhões de dólares em direitos especiais de saque para países europeus, e apenas 34 bilhões para países africanos. A representação desigual e distorcida na direção do FMI e do Banco Mundial é inaceitável”, criticou.
Leia também: Em Joanesburgo, cúpula dos Brics discute adesão de novos países ao bloco
“Tradições humanistas”
Em defesa do resgate das “melhores tradições humanistas que inspiraram a criação da ONU”, Lula ressaltou a importância da luta pela liberdade de informação e comunicação. Neste ponto, o presidente fez questão de citar o caso do jornalista e fundador do Wikileaks, Julian Assange, preso desde 2019 por ter publicado documentos oficiais que revelavam crimes de guerra cometidos pelo governo dos Estados Unidos no Afeganistão e no Iraque.
“É fundamental preservar a liberdade de imprensa. Um jornalista, como Julian Assange, não pode ser punido por informar a sociedade de maneira transparente e legítima. Nossa luta é contra a desinformação e os crimes cibernéticos. Aplicativos e plataformas não devem abolir as leis trabalhistas pelas quais tanto lutamos”, argumentou.
Em relação aos conflitos armados entre países, Lula os classificou como “uma afronta à racionalidade humana”. Segundo ele, “a promoção de uma cultura de paz é um dever de todos nós. Construí-la requer persistência e vigilância”.
Brasil na ONU
Em 2023, o tema do debate geral de chefes de Estado da Assembleia Geral da ONU é “Reconstruir a confiança e reacender a solidariedade global: acelerando ações para a Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável rumo à paz, prosperidade, ao progresso e à sustentabilidade para todos”.
Em seu discurso, o presidente Lula reforçou o compromisso do Brasil com a construção de um modelo de desenvolvimento “socialmente justo e ambientalmente sustentável”. “Como não me canso de repetir, o Brasil está de volta. Nosso país está de volta para dar sua devida contribuição ao enfrentamento dos principais desafios globais”, declarou.
Desde o último sábado (16) em Nova Iorque, Lula participou de de reuniões com empresários e autoridades estrangeiras. Para os próximos dias estão agendados encontros com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, dos Estados Unidos, Joe Biden, e com o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom.
Assista a íntegra do discurso do presidente na abertura da 78ª Assembleia Geral da ONU.
*com informações da Agência Brasil, Brasil de Fato e Carta Capital