Na última terça-feira (5), a Constituição da República Federativa do Brasil completou o 33º aniversário. Considerada o principal símbolo da redemocratização brasileira após 21 anos de ditadura civil-militar, a sétima Carta da história do país ficou internacionalmente conhecida pelos avanços que trouxe em relação aos direitos à cidadania e à dignidade da pessoa humana.
Responsável por instituir o Estado Democrático de Direito no Brasil, a chamada “Constituição Cidadã” é celebrada em todo território nacional como conquista histórica do povo brasileiro. No entanto, hoje, além de estar longe de cumprir com os objetivos fundamentais elencados no texto constitucional, o país enfrenta uma onda de ataques à Carta e aos direitos por ela garantidos.
Carta Cidadã
Promulgada em 5 de outubro de 1988, após 20 meses de trabalhos da Assembléia Constituinte que envolveu 487 deputados e 72 senadores, a Constituição Federal foi responsável por instituir uma ampla lista de direitos civis, políticos, sociais e econômicos que vão desde o acesso universal à educação, saúde e cultura até o reestabelecimento da soberania popular através do voto direto, secreto e com o mesmo valor para todos os eleitores e eleitoras.
Entre as diversas mudanças propostas pela Constituição destacam-se as questões ligadas à seguridade da dignidade humana e à ampliação dos direitos sociais. A proibição da tortura, o fim da censura, a presunção da inocência, o direito de Justiça gratuita e a igualdade jurídica entre homens e mulheres foram algumas das conquistas consolidadas pelo texto constitucional. Em relação aos direitos trabalhistas, por exemplo, outros avanços registrados foram a redução de jornada semanal de 48 para 44 horas, a criação do seguro-desemprego, o direito à greve e a liberdade sindical, inclusive para servidores públicos.
Em tempos de pandemia e escândalos na área da saúde, também cabe lembrar que em 1988 foi previsto como “direito de todos e dever do Estado” a criação de um “Sistema Único de Saúde”. Sistema este que surgiria dois anos depois com a Lei 8.080/90.
A cumprir
Muitos dos objetivos previstos na Constituição, contudo, estão distantes de serem cumpridos pelo Estado brasileiro. O artigo 3º do documento, por exemplo, estabelece que como objetivos fundamentais da República está a construção de “uma sociedade livre, justa e solidária”, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e das desigualdades sociais e regionais, e a promoção do bem de todos “sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Leia mais: Estudo aponta que risco de morrer de Covid-19 é maior entre negros
Através das redes sociais, o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso classificou as dívidas do Estado com o texto constitucional como “agenda inacabada”:
A Constituição de 1988 completa 33 anos. Estabilidade institucional e avanços importantes em direitos de mulheres, negros, gays e comunidades indígenas. A agenda inacabada: derrotar a pobreza extrema, as desigualdades injustas e promover desenvolvimento sustentável para todos.
— Luís Roberto Barroso (@LRobertoBarroso) October 5, 2021
Disputa
Desde que foi promulgada a Carta de 1988, o Brasil vive o mais longo período de estabilidade institucional de sua história. Mesmo assim, o texto constitucional segue em permanente disputa. A reforma administrativa proposta pelo governo Bolsonaro através da PEC 32 é um dos atuais exemplos dessa tensão. Segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), ao longo de 33 anos o texto constitucional sofreu 117 emendas.
No histórico discurso em que declarou “ódio à ditadura”, o próprio Ulysses Guimarães assumiu: “A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa ao admitir a reforma”.
Todavia, o constituinte também alertou: “Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria”.
Confira o áudio original da sessão que marcou a promulgação da Constituição Federal:
Edição: Jaqueline Deister