No último ano, 2.575 pessoas foram resgatadas de situação análoga à escravidão no Brasil. De acordo com informações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), trata-se do maior número desde 2013, quando foram encontrados 2.808 trabalhadores em situações semelhantes. Ao todo, desde 1995, quando foram criados os grupos especiais de fiscalização móvel para o combate à escravidão no país, foram 60.251 trabalhadores resgatados em solo nacional.
No próximo sábado (28), será celebrado o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. A data foi instituída após o assassinato, em 2004, de quatro funcionários do Ministério do Trabalho durante uma operação de fiscalização no município de Unaí, em Minas Gerais.
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Segundo inquérito da Polícia Federal (PF), os auditores fiscais Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram executados a mando de uma família de fazendeiros da região após a aplicação de uma série de multas por descumprimento de leis trabalhistas. Apontados como mandantes, os irmãos Antério e Norberto Mânica foram condenados pela Justiça, mas aguardam recursos em liberdade.
Combate
Em 2022, as equipes de fiscalização realizaram 462 operações, que resultaram em mais de R$ 8 milhões em verbas salariais e rescisórias. Dos 20 estados fiscalizados, apenas Alagoas, Amazonas e Amapá não registraram casos de escravidão contemporânea.
As ações foram coordenadas pela Inspeção do Trabalho em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Polícia Federal (PF), a Polícia Rodoviária Federal (PRF), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU). Além destas entidades, os grupos de fiscalização também são compostos, em alguns estados, por equipes ligadas às Superintendências Regionais do Trabalho, com apoio das Polícias Civil, Militar e Ambiental.
Minas Gerais foi o estado com mais operações (117) e com o maior número de trabalhadores resgatados (1.070). Desde 2013 o estado lidera em número de casos. No último ano, somente no município de Varjão de Minas foram encontrados 273 trabalhadores em condições degradantes na atividade de corte de cana-de-açúcar.
A lista de estados com o maior número de vítimas em 2022 segue com Goiás (271), Piauí (180), Rio Grande do Sul (156) e São Paulo (146).
Os dados sobre as fiscalizações podem ser consultados no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil do Radar SIT.
Perfil
Dos trabalhadores resgatados em 2022, 92% eram homens, 29% tinham entre 30 e 39 anos, 51% residiam no Nordeste e 58% nasceram na região. Em relação aos dados de raça e etnia, 83% se autodeclararam negros ou pardos, 15% brancos e 2% indígenas.
Quanto à escolaridade, 23% afirmaram ter estudado até o quinto ano incompleto e 20% haviam cursado do sexto ao nono, também incompletos. Já 7% dos trabalhadores resgatados se declararam analfabetos.
De acordo com o MTE, entre as pessoas encontradas em situação análoga à de escravo, havia também 35 crianças e adolescentes. Dez menores de 16 anos e 25 com idade entre 16 e 18 anos.
Foram encontrados ainda 148 vítimas migrantes de outros países: 101 paraguaios, 25 bolivianos, 14 venezuelanos, quatro haitianos e quatro argentinos.
Do total de resgatados, 87% estavam em atividades rurais. O cultivo da cana-de-açúcar foi a atividade com maior número de vítimas (372). Na sequência aparecem atividades de apoio à agricultura (273), produção de carvão vegetal (212), cultivo de alho (171), de café (168), de maçã (126), extração e britamento de pedras (115), criação de bovinos (110), cultivo de soja (108), extração de madeira (102) e construção civil (68).
Os fiscais encontraram ainda 30 pessoas em situação de trabalho escravo doméstico, em 15 unidades da federação. Dez apenas na Bahia. De acordo com o MTE, a repercussão do caso da trabalhadora doméstica Madalena Gordiano, no final de 2020, fez com que o número de denúncias relativas a este setor aumentasse em todo o país.
Denúncia
De acordo com o artigo 149 do Código Penal, reduzir alguém a condição análoga à de escravo é crime com penas de reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
De modo geral, são considerados casos de escravidão contemporânea os que envolvem: submissão a trabalhos forçados; submissão a jornada exaustiva (aquela que leva ao esgotamento, colocando em risco a saúde e a vida); a sujeição de trabalhador a condições degradantes de trabalho; a restrição da locomoção do trabalhador bem como a vigilância ostensiva no local de trabalho, com o fim de retê-lo no local de trabalho; a posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador por parte do empregador com o fim de retê-lo no local de trabalho; e a servidão por dívida.
As denúncias de trabalho análogo ao de escravo em território brasileiro podem ser ser feitas pela internet através do Sistema Ipê.
Edição: Jaqueline Deister