Com 10 anos recém completados na última segunda-feira (16), a Lei de Acesso à Informação (LAI) tem enfrentado uma série de ataques nos últimos anos e está sob risco de fragilização de seus efeitos. É o que aponta o relatório “10 anos da Lei de Acesso à Informação: de onde viemos e para onde vamos”, produzido e publicado pela Artigo 19, organização que atua em defesa e pela promoção do direito à liberdade de expressão e de acesso à informação em todo o mundo.
A partir da consulta a mais de 30 especialistas da sociedade civil, governo, academia e movimentos sociais, o documento reúne diagnósticos quanto à transparência e a garantia do direito de acesso à informação pública desde a implementação da LAI e alerta sobre as “graves tentativas de desmonte do regime e da cultura de transparência no Brasil”.
De acordo com o relatório, a LAI é, hoje, “o mais importante documento para a implementação do regime de transparência no Brasil, tendo criado dispositivos que obrigam o Estado à disseminação de informações e que asseguram a cidadãs e cidadãos interessadas o direito de demandá-las e recebê-las”.
Fruto de pressão e mobilização da sociedade civil junto ao Poder Legislativo, a lei foi elaborada no período concomitante à criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), órgão responsável pela investigação das violações de direitos humanos e crimes cometidos por agentes de Estado no período da ditadura militar brasileira.
Para Denise Dora, diretora-executiva da Artigo 19, a Lei de Acesso à Informação deve ser não apenas celebrada, como defendida e trazida para o centro do debate público:
“A LAI é uma poderosa ferramenta no combate ao autoritarismo e a diversas formas de violação a direitos fundamentais. É imprescindível trazê-la para o centro do debate público, pois, sem ela, não é possível vislumbrar um Estado Democrático de Direito. Isso significa retomarmos o compromisso com um regime democrático, transparente e que promova a participação social”, afirma.
Relatório
Dividido em três seções, o relatório “10 anos da Lei de Acesso à Informação: de onde viemos e para onde vamos” traz um resgate histórico-político do regime de transparência e de seus dispositivos, além de análises sobre o cenário atual da garantia do direito à informação e de uma proposta de agenda para os próximos anos.
A primeira parte da publicação – “De onde viemos” – recapitula o processo de aprovação da lei e os principais avanços e retrocessos percebidos desde que entrou em vigor. Neste ponto, a coordenadora da Área de Acesso à Informação e Transparência da Artigo 19, Júlia Rocha, ressalta que os últimos anos tem sido marcados por tentativas de enfraquecimento da LAI, mas também por uma preocupação maior por parte da população em relação ao acesso à informação e a transparência.
“Seja por meio de decretos ou de atos concretos, o que se percebe é uma banalização do sigilo e do não compartilhamento de informações, principalmente para ganhos políticos ou pessoais, além de uma inação preocupante dos órgãos de controle. Contudo, não podemos deixar de notar uma maior presença de estruturas de solicitação de informação em nível municipal, por exemplo, ou então uma preocupação evidentemente maior, a partir da sociedade civil, com questões relacionadas à divulgação de informações oficiais”, destacou.
A segunda parte do estudo – “Onde estamos” – traz quatro estudos de caso sobre temas que notoriamente têm baixa transparência no acesso à informação, como o enfrentamento à pandemia da COVID-19, a promoção de direitos sexuais e reprodutivos, a transparência florestal, e a circulação de desinformação em períodos eleitorais. Em relação a este último ponto, o relatório adverte que “se as eleições de 2022 refletirem a quantidade de desinformação que tem sido perpetuada por grupos bolsonaristas nos últimos três anos de governo, ao que tudo indica, o pleito eleitoral será bastante atribulado em termos de desordem informacional”.
Por fim, a terceira e última parte do documento – “Para onde vamos” – reúne propostas concretas de como melhorar a infraestrutura de transparência já existente, como impedir seu desgaste e, sobretudo, como aprofundar a democratização do direito à informação no País. Neste sentido, a Artigo 19 destaca a importância de oferecer informações necessárias para a efetivação de serviços a servidoras e servidores que atuam nas pontas das políticas públicas e a necessidade de um resgate à cultura da transparência nas esferas governamentais do país.