A Constituição Federal de 1988 é clara em seu Artigo quinto: é ‘livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença’. Porém, a interpretação da lei nem sempre assegura os direitos básicos. É o que ocorre, por exemplo, com a Rádio Comunitária Livre Coité FM, localizada na cidade de Conceição do Coité, na Bahia.
A emissora atua há dezessete anos no serviço de radiodifusão comunitária em áreas mais pobres do município. Há quinze anos a rádio entrou com o pedido de outorga no Ministério das Comunicações (MiniCom) e até hoje o pedido não foi deferido. Em março, a Coité FM recebeu um duro golpe da Justiça. O comunicador e ex-diretor da rádio, Zacarias de Almeida da Silva, conhecido como Piter Júnior, foi condenado pelo crime de exploração clandestina de serviço de radiodifusão sonora.
Na sentença, a juíza federal Karin Almeida Weh condenou Piter a dois anos de prisão, que foram substituídos pela prestação de serviço comunitário e ao pagamento de dez mil reais.Dois meses depois, a história de Piter pelos tribunais se repete com a atual presidenta da Associação Comunitária Coité, Núbia da Silva Oliveira.
Desde 2013, Núbia tem o seu nome atrelado a uma ação penal por crime contra as telecomunicações. Na última terça-feira (12), a diretora da rádio foi até o Fórum do município para dar o seu depoimento numa audiência. Para Piter, não resta dúvida de que o caminho traçado por Núbia será também o da condenação.
Segundo ele, as circunstâncias dos processos judiciais chegaram a colocar em risco a continuação da Rádio Coité FM. Em entrevista à Pulsar Brasil, o comunicador ressaltou que durante uma assembleia foi cogitada a possibilidade da rádio funcionar somente pela web. Contudo, a limitação de alcance e o fato da internet ainda ser uma barreira para o principal público da emissora fizeram com que os associados desistissem da ideia e optassem por eleger uma nova presidência para evitar mais desgastes judiciais com a então diretora Núbia Oliveira.
Desde a condenação de Piter Júnior, entidades ligadas à democratização da comunicação têm demonstrado total apoio à Rádio Coité FM. A Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC) e a Artigo 19 lançaram uma carta em repúdio à sentença e o caso foi alvo de debate no segundo Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação, que ocorreu em Belo Horizonte no mês de abril.
A advogada da Artigo 19 Karina Quintanilha, que está acompanhando o caso da Coité FM na Justiça Federal e no Ministério das Comunicações, alega que para combater a criminalização da rádio comunitária foram apresentados dois pareceres de violação de direito de liberdade de expressão. Ela destaca que também foi apresentado um recurso administrativo no Ministério das Comunicações para reverter o arquivamento do processo de outorga da rádio.
O caso da Coité FM se tornou emblemático no campo da comunicação comunitária. A rádio foi citada no relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) referente ao ano passado como exemplo de violação de direito.
Enquanto a Justiça brasileira condena inocentes e o Ministério das Comunicações priva comunicadores populares, Piter reafirma o seu sonho de legalizar a Coité FM para que todas as vozes tenham a liberdade de se expressar. (pulsar)