Ardência nos olhos, coceira na pele e desconforto respiratório. Estes são alguns dos sintomas manifestados por moradores de Vila do Conde, distrito de Barcarena, no Pará, após o incêndio ocorrido na última segunda-feira (6) em um galpão de produtos químicos na Planta Industrial da mineradora Imerys Rio Capim.
De acordo com o Corpo de Bombeiros, o incêndio começou às 20h e foi controlado por volta de meia noite de terça-feira (7). Não houve feridos no local, no entanto, segundo o Ministério Público Federal (MPF), a nuvem de fumaça branca que se dispersou sobre a região depois do incêndio provocou “irritações respiratórias e na pele das pessoas da vizinhança, assim como o temor de uma contaminação mais grave”.
Segundo a prefeitura de Barcarena, até a tarde de terça-feira, 49 pessoas foram atendidas em Unidades de Pronto Atendimento (UPA) locais com sintomas leves e moderados de desconforto respiratório.
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De acordo com a própria Imerys, o incêndio ocorreu “em uma pequena parcela do produto químico Hidrossulfito de Sódio”, que consiste em um pó granular de coloração branco acinzentado com odor característico de dióxido de enxofre. Ainda segundo a mineradora: “O Hidrossulfito de Sódio pode provocar irritação temporária do aparelho respiratório, caso seja inalado”.
Crime ambiental
Na terça-feira (7), o MPF enviou uma recomendação à transnacional francesa para que dê “ampla publicidade quanto aos fatos ocorridos, às apurações preliminares da própria empresa, às providências já adotadas e medidas a serem tomadas quanto ao incidente para assegurar transparência para a população afetada”.
A medida também recomenda à empresa que “imediatamente dê suporte de saúde e assistência material às pessoas atingidas, especialmente crianças, em razão da intensa poluição do ar, dos deslocamentos de residências decorrentes do forte cheiro de produtos químicos e da eventual necessidade de evacuação da área”.
No documento, o MPF também trata “da necessidade de resposta imediata para proteção do meio ambiente, com a adoção de medidas preventivas e corretivas”, e estabelece o prazo de 48h para que a mineradora protocole junto ao órgão “informação detalhada sobre o incidente, possíveis causas identificadas, providências já tomadas e a serem adotadas quanto aos impactos à saúde e socioambientais decorrentes do incêndio”.
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Ainda na terça-feira, uma equipe de fiscais da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) esteve no local em visita de vistoria para avaliar os danos ambientais causados. A Prefeitura de Barcarena também notificou a Imerys para que apresente Ficha de Informação de Segurança de Produtos Químicos (FISPQ), plano de contingência e laudo da qualidade do ar.
Em comunicado divulgado na terça-feira, a empresa informou que: “As investigações estão em curso com a participação das autoridades locais, sem riscos detectados de novos focos de incêndio”. No texto, a Imerys também garante que “está em contato direto com a Prefeitura de Barcarena, auxiliando no que for aplicável e necessário”.
Histórico
Desde 2014, esta é a quarta vez que a Imerys é responsável por danos ambientais e de saúde à população de Barcarena. Nas ocorrências anteriores foram registrados vazamentos de caulim, principal minério explorado pela fábrica da transnacional francesa, no igarapé da Vila do Conde.
Em outubro de 2016, o MPF e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) chegaram a recomendar a enviar à Semas uma notificação recomendando a suspensão das atividades da mineradora na região.
Na ocasião, o MPF e o MPPA fizeram questão de listar a série histórica de crimes ambientais cometidos pela empresa. No documento constam vazamentos “de material proveniente de bacias de rejeito” (2004, 2006, 2007, 2012, 2014) e o “rompimento de duto com efluentes ácidos” (2011).
Segundo a própria transnacional, a Imerys está em funcionamento no Pará desde os anos 1980, nas cidades de Barcarema e Ipixuna do Pará. São duas minas de extração do minério caulim e a maior planta de beneficiamento do mineral no mundo. Conforme consta na página institucional da empresa, a maior parte do minério é destinado ao mercado internacional.
Repúdio
A nota “Deixa Barcarena Respirar” publicada na última terça-feira conta com a assinatura de mais de 30 comunidades, lideranças, movimentos e organizações sociais ligadas à Frente em Defesa dos Territórios. O documento relata que a Imerys “vem sendo denunciada há anos pelos moradores de Barcarena por contaminar rios, igarapés, poços, o solo e o ar com resíduos e rejeitos”. No texto, as organizações manifestam solidariedade aos moradores de Barcarena e exigem que “a empresa seja devidamente responsabilizada por mais esse crime ambiental”.
Dentre as penalidades elencadas na nota, estão: a suspensão de atividades da mineradora até que sejam apuradas as denúncias de irregularidades, a proibição de acesso por parte da Imerys a recursos públicos, a obrigação de distribuir gêneros alimentícios, água e materiais de proteção individual à população atingida e a realização imediata de exames, consultas e tratamento especializado à todas as pessoas afetadas pela contaminação dos gases/produtos químicos disseminados no ar e nas águas.
O documento também exige que a mineradora produza um mapeamento participativo de todas as áreas de risco de desastres naturais, elabore um Plano de Prevenção, Redução e Combate a Desastres para Barcarena e municípios próximos. Por fim, as organizações cobram que a Imerys seja penalizada financeiramente pelo recente desastre e o que seja apurado possível crime de responsabilidade por parte de gestores públicos municipais, estadual e federal.
Edição: Jaqueline Deister