Redação
A Justiça Federal do Amazonas determinou, nesta quarta-feira (8), que a União reforce as buscas pelo indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Philips. Ambos estão desaparecidos desde o último domingo (5) na região do Vale do Javari, no extremo oeste do Amazonas.
A decisão atende um pedido da Defensoria Pública da União e da União das Organizações Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e considera que existe um “contexto de omissão” do Estado em relação à região que, ainda segundo o documento, “vem sendo mantida em situação de baixa proteção e fiscalização”.
A ordem proferida pela juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível da Justiça Federal do Amazonas, requer a viabilização de mais helicópteros, embarcações e equipes de buscas da Polícia Federal, das Forças de Segurança ou das Forças Armadas, para encontrar os desaparecidos. A magistrada ainda autorizou o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União a requisitar diretamente da Polícia Federal, do Comando Militar da Amazônia e da Força Nacional de Segurança, as “providências urgentes e necessárias” ao cumprimento de sua decisão.
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O desaparecimento de Pereira e Philips veio a público na manhã da última segunda-feira (6) por meio de uma nota conjunta divulgada pela Univaja e pelo Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI).
Segundo as organizações, o servidor licenciado da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o colaborador do The Guardian foram vistos pela última vez no domingo (5) de manhã, quando viajavam em uma embarcação de pequeno porte entre a comunidade ribeirinha São Rafael e a cidade de Atalaia do Norte, próximo à fronteira com o Peru.
Segundo a Univaja, Pereira e Philips estariam percorrendo a região desde a sexta-feira (3). O objetivo da viagem era apresentar ao jornalista o trabalho de monitoramento e proteção territorial desenvolvido no território pelos próprios indígenas. Ainda de acordo com a entidade, a dupla teria recebido ameaças dias antes do desaparecimento.
Conforme informações da agência Amazônia Real, a Terra Indígena Vale do Javari abriga mais de seis mil indígenas dos povos Marubo, Kanamari, Kulina, Matsés, Matís, Kobubo e grupos de recente contato e em isolamento voluntário. Segundo a agência, líderes indígenas têm relatado o aumento das invasões de seus territórios e das ameaças desde a eleição de Jair Bolsonaro (PL) à Presidência da República, no final do ano de 2018.
Em nota divulgada na última terça-feira (7), a Univaja junto com o OPI, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) destacam que a região do desaparecimento de Bruno Pereira e Dom Philips “condensa conflitos graves num clima de violência em que madeireiros, pescadores ilegais e o narcotráfico internacional exercem suas atividades […] diante da incapacidade e omissão dos órgãos responsáveis pela fiscalização e proteção dos territórios indígenas”.
Buscas
Desde domingo, a equipe de vigilantes da Univaja tem percorrido o perímetro em torno do trajeto que Bruno Pereira e Dom Philips avisaram que fariam, mas não obtiveram sucesso até o momento. A investigação do caso está sob responsabilidade da Polícia Federal (PF).
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Em nota divulgada terça-feira (7), o Ministério da Defesa informou que a Marinha do Brasil enviou ao local uma equipe de Busca e Salvamento (SAR) com o auxílio de um helicóptero, embarcações e uma moto aquática. O órgão também afirma que cerca de 150 militares do Exército e um helicóptero estão colaborando com as equipes de busca da PF.
As buscas também têm sido acompanhadas por equipes da Polícia Militar do Amazonas (PM-AM) e da Funai. Contudo, segundo a Defensoria Pública da União e a Univaja, as medidas de buscas adotadas até o momento são insuficientes, em razão do tamanho da área a ser vasculhada.
Ainda na terça-feira, um homem foi preso pela PM em Atalaia do Norte. Segundo o procurador jurídico da Univaja, Eliesio Marubo, “há uma vasta quantidade de provas” contra o detido. A Polícia Civil, contudo, afirma que ainda apura a relação do suspeito com o desaparecimento de Bruno Pereira e Dom Philips.
Outros dois suspeitos, identificados apenas como “Churrasco” e “Jâneo”, também foram detidos pela Polícia Civil na segunda-feira, mas foram liberados após prestarem esclarecimentos.
Em mensagem publicada nas redes sociais, a esposa de Dom Philips, a brasileira Alessandra Sampaio, e a esposa de Bruno Pereira, a antropóloga Beatriz Matos, apelaram às autoridades para que todos os recursos possíveis fossem empregados nas buscas.
“Apelamos às autoridades locais, estaduais e nacionais que deem prioridade e urgência na busca pelos desaparecidos”, escreveu Beatriz.
“Na floresta, cada segundo conta, cada segundo pode ser vida ou morte. Sabemos que, depois que anoitece, se torna muito difícil se mover, quase impossível encontrar pessoas desaparecidas. Uma manhã perdida é um dia perdido, um dia perdido é uma noite perdida”, disse Sampaio.
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Segundo reportagem da Amazônia Real, um indígena que fazia parte da equipe de vigilantes que acompanhavam Philips e Pereira pela região do Vale do Javari teria dito que a dupla foi vítima de uma emboscada próxima à localidade de Cachoeira, em Atalaia do Norte. Por segurança, o indígena preferiu não se identificar.
O desaparecimento do indigenista brasileiro e do jornalista britânico alcançou repercussão internacional e chegou a ser noticiado por veículos como o The Guardian, BBC News, Le Monde, Washington Post e New York Times.
* Com informações da Amazônia Real e Estado de S. Paulo