“O Zé Claudio e a Maria foram defensores dos direitos humanos e da floresta”. É desse modo que Claudelice Santos, coordenadora do Instituto Zé Claudio e Maria, se refere ao irmão José Claudio Ribeiro da Silva e à cunhada Maria do Espírito Santo da Silva, ambos assassinados no dia 21 de maio de 2011 dentro do assentamento agroextrativista Praialta-Pinheira, em Nova Ipixuna, sudoeste do Pará. O casal de agricultores foi morto a tiros em uma emboscada a oito quilômetros de casa. As suspeitas são de que o crime tenha sido encomendado por madeireiros incomodados com as constantes denúncias feitas por Zé Cláudio e Maria sobre a extração ilegal de madeira e a grilagem de terras públicas da região.
Apesar da dor e da saudade, 10 anos após o crime, a luta dos ativistas segue forte e renovada através da “Romaria dos Mártires da Floresta”. Um evento anual organizado coletivamente por movimentos e organizações sociais que fazem questão de celebrar a vida e memória de Zé Claudio e Maria.
Segundo Claudelice, logo nos anos seguintes à morte do casal foram realizados atos públicos nos quais prevalecia o tom de indignação e de cobrança por investigações pelo assassinato. No entanto, conforme ela conta, com o passar do tempo, os grupos responsáveis pela organização dos atos sentiram a necessidade de transformar a data em momento também de esperança. Claudelice recorda que Zé Claudio e Maria eram católicos e que a fé sempre esteve presente na luta dos dois em defesa da floresta e dos diretos humanos. Por isso, em 2016, surge a ideia de realizar as romarias dos mártires.
“Muita gente pergunta: ‘Por que romaria se eles não eram santos?’. De fato eles não eram. E a nossa pretensão não é torná-los santos, mas sim levar para sempre a mensagem de fé, esperança e amor que eles tinham. Não deixar isso cair no esquecimento e honrar essa memória, essa visão de fé, esperança e amor pela natureza, pelo outro, pela humanidade” explica a irmã de Zé Claudio.
Segundo a coordenadora do Instituto Zé Claudio e Maria, a romaria saía do local onde ocorreu o crime até a casa onde o casal vivia. O ato de dois dias era encerrado aos pés da “majestade” que permanece até hoje no lote. Majestade é o apelido dado às enormes castanheiras típicas da região amazônica e quase extintas no sudeste e sul do Pará. As primeiras edições da romaria atraíam centenas de participantes de todo o estado.
Contudo, devido a pandemia de Covid-19, desde 2020 o evento teve que ser adaptado para o ambiente virtual. Neste ano, em sua sexta edição, a programação conta com inovações como lives de rodas de conversa, webinarios e um podcast especial que rememora o legado deixado por Maria e Zé Claudio. As atividades começaram no dia 20 de maio e seguem até o dia seis de junho. Apesar das mudanças, Claudenice garante que o espírito da Romaria permanece o mesmo.
“Não perder o esperançar! Era isso que Zé Claudio e Maria falavam. Não perder a fé de que teremos dias melhores, que conseguiremos manter nossas florestas, nossos rios. Que conseguiremos manter nossos povos com direitos e dignidade. Mas para isso, é preciso ter a ousadia de continuar lutando. Nós precisamos refletir sobre as formas de violência em que os povos são cometidos e ser ousados nas nossas lutas” conclui.


Impunidade
Além de semear a esperança e celebrar a memória de Zé Claudio e Maria, a “Romaria dos Mártires da Floresta” também tem servido para cobrar justiça das autoridades. Em primeiro lugar porque anos antes do crime, o casal já denunciava amplamente as ameaças de morte que recebiam, tanto em boletins de ocorrência como em entrevistas e depoimentos a veículos de comunicação. Todavia, segundo a irmã de Zé Claudio, nenhuma providência foi tomada pelas autoridades públicas para garantir a segurança dos agricultores e impedir o crime.
Após 10 anos, o mandante do duplo homicídio segue foragido da justiça. Segundo Claudenice, dois executores foram condenados e presos em 2013. Já o mandante, José Rodrigues Moreira, encontra-se foragido desde 2016, quando foi condenado a 60 anos de prisão. Diante da impunidade, movimentos sociais lançaram um manifesto e estão recolhendo assinaturas para cobrar justiça das autoridades públicas estaduais e federais.