Redação
Por unanimidade dos votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional o uso da tese da legítima defesa da honra em crimes de feminicídio ou de agressão contra mulheres. O julgamento foi realizado na última terça-feira (1), no retorno das atividades da Corte no segundo semestre.
Com a decisão, advogados, policiais e juízes não poderão mais usar o argumento de “legítima defesa da honra” para justificar ou absolver o comportamento de acusados. A regra vale tanto para a fase de investigação dos casos como para os processos que chegam ao Tribunal do Júri. Além disso, os resultados de julgamentos que se basearam na tese poderão ser anulados por tribunais de instâncias superiores.
De acordo com o STF, o argumento da legítima defesa da honra em casos de violência contra a mulher contraria os princípios constitucionais da dignidade humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.
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Ao justificar o voto, a presidente da Corte, ministra Rosa Weber, defendeu que em uma sociedade democrática, livre e fundada no primado da dignidade humana, “não há espaço para a restauração dos costumes medievais e desumanos do passado”. Segundo a ministra, o argumento de legítima defesa da honra servia apenas para reforçar a “ideologia patriarcal fundada no pressuposto da superioridade masculina pela qual se legitima a eliminação da vida de mulheres”.
Na mesma linha, a ministra Cármen Lúcia observou que, mais do que uma questão jurídica, a tese envolve uma questão de humanidade.
“Nós estamos falando de dignidade humana, de uma sociedade que ainda é machista, sexista, misógina e mata mulheres apenas porque elas querem ser o que elas são: mulheres, donas de suas vidas”, afirmou a ministra.
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Defesa da honra
A decisão do STF diz respeito à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779 protocolada ainda em 2021 pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). O julgamento havia sido iniciado em junho – quando a Corte chegou a formar maioria contra a tese – e foi concluído nesta semana com os votos das ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia.
A declaração de inconstitucionalidade da tese da “legítima defesa da honra” encerra uma longa tradição na legislação brasileira de normas que, historicamente, chancelaram a violência contra a mulher.
Entre 1605 e 1830, por exemplo, a violência contra a mulher era autorizada aos homens que tivessem a “honra lesada” por adultério. Nos anos seguintes, entre 1830 e 1890, as normas penais deixaram de permitir o assassinato, mas mantiveram o adultério como crime.
Somente no Código Penal de 1940, a absolvição de acusados que cometeram crime sob a influência de emoção ou paixão deixou de existir. Contudo, até hoje era comum que a tese fosse utilizada para defender a inocência ou amenizar a pena de agressores e feminicidas.
*com informações do STF, Agência Brasil e Conjur