Redação
A Câmara dos deputados aprovou, na última terça-feira (13), a Proposta de Emenda à Constituição que institui o estado de emergência no país (PEC 15/2022). Com a decisão, o governo federal será autorizado a gastar R$ 41,25 bilhões em uma série de benefícios sociais a menos de três meses das eleições e sem as limitações do teto de gastos e da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Aprovada no Senado em 30 de junho, a PEC teve 425 votos favoráveis e 7 contrários entre os deputados no primeiro turno. No segundo turno, foram 469 votos a favor e 17 contra.
Durante a votação, o Plenário da Câmara também rejeitou as sugestões de mudança do texto (destaques) feitas por partidos de oposição. Entre elas estavam o destaque do Partido dos Trabalhadores (PT) que pretendia retirar a expressão “estado de emergência” que ampara os gastos extraordinários; e o destaque do partido Novo, que propunha suprimir do texto a dispensa do atendimento da legislação sobre responsabilidade fiscal, regra de ouro e cumprimento de meta de resultado primário no orçamento.
Em pronunciamento, a deputada Luiza Erundina (Psol-SP), classificou a proposta do governo como “estelionato eleitoral”:
“Esta proposta de emenda constitucional é um vergonhoso estelionato eleitoral, pois a 70 dias do processo eleitoral, de eleições gerais no país, o presidente é tomado de repente por um terrível amor aos pobres e resolve fazer esse pacote de benefícios na tentativa de comprar o voto do povo”, disse Erundina.
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De acordo com o texto aprovado pela Câmara, do total de R$ 41,25 bilhões, R$ 26 bilhões serão destinados para a expansão do Auxílio Brasil e R$ 1,05 bilhão para o vale-gás de cozinha. Também serão criados auxílios aos caminhoneiros e taxistas que, somados, totalizam R$ 7,4 bilhões.
A proposta também prevê o financiamento de R$ 2,5 bilhões para garantir a gratuidade de transporte coletivo para idosos e R$ 3,8 bilhões para compensar os estados que concederem créditos de ICMS para produtores e distribuidores de etanol. Por fim, a PEC ainda destina R$ 500 milhões para reforçar o programa Alimenta Brasil (R$ 500 milhões), que compra alimentos de agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, povos indígenas e demais populações tradicionais para distribuí-los a famílias de baixa renda.
Estado de Emergência
De acordo com o artigo 73 da Lei das Eleições, (Lei nº 9.504/97), a criação de benefícios destinados a pessoas físicas e a transferência voluntária de recursos a estados e municípios são proibidas nos três meses que antecedem as eleições. A única exceção seria em “situações de emergência e de calamidade pública”. A instituição do estado de emergência, através da PEC, portanto, blinda o presidente e pré-candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) de possíveis punições previstas na lei eleitoral.
Além disso, com a aprovação e promulgação da PEC, o chefe do Executivo não será obrigado a atender as exigências legais estabelecidas pela Constituição Federal através da Emenda Constitucional 95 (teto de gastos) e pela Lei de Responsabilidade de Fiscal. Também não será necessária a aprovação pelo Congresso de autorização específica para descumprir a chamada “regra de ouro” do Orçamento, que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, como salários, benefícios de aposentadoria, contas de luz e outros custeios da máquina pública.
Cabe observar que a figura do estado de emergência não consta na Constituição Federal de 1988. O texto constitucional fala em estado de defesa, estado de sítio e estado de calamidade pública – que, inclusive, foi citado na chamada “Emenda do Orçamento de Guerra” (Emenda Constitucional 106/20), que autorizou gastos excepcionais durante a pandemia da Covid-19.
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A última vez que o estado de emergência foi incluído em uma Constituição no país foi em 1937, durante a instauração da ditadura do Estado Novo por Getúlio Vargas. A versão getulista da medida vigorou até 1945 e previa a adoção do estado de emergência em casos de conspiração que pudesse perturbar a paz pública, pôr em perigo as instituições e a segurança do Estado. Já a versão bolsonarista propõe o reconhecimento, em 2022, do “estado de emergência decorrente da elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo”.
“Inconstitucional”
Na avaliação do subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU), Lucas Rocha Furtado, a emenda constitucional proposta pelo Palácio do Planalto é “flagrantemente inconstitucional” e pode, inclusive, levar à impugnação de mandato eletivo, que é o exercício das prerrogativas e o cumprimento das obrigações de cargos específicos por um período de tempo determinado por lei.
Durante a semana, o MP-TCU entrou com um pedido de medida cautelar contra a PEC. Segundo o órgão, o presidente se utiliza de uma “suposta ‘imprevisibilidade’ a ameaçar a segurança alimentar da população brasileira” para justificar a proposta.
“Existem evidências de que a pretensa situação emergencial teria sido artificialmente fabricada, com o verdadeiro intuito de servir a interesses eleitorais do pretendente à reeleição presidencial, na medida em que resultaria na distribuição de benesses de forma gratuita a determinados segmentos da população, em verdadeiro abuso político e econômico e em atentado ao princípio da anterioridade eleitoral”, destaca o texto da representação.
* Com informações da Agência Câmara e Estado de S. Paulo
Edição: Jaqueline Deister